Há muitos e muitos anos, quando eu ainda estava na faculdade de Publicidade, ouvi um redator dizer que “cultura de publicitário tem que ser igual a massa de pizza: fina e comprida”. Ou seja: tem que saber um pouco de tudo, mas sem necessariamente ir tão a fundo nos temas. Eu estava começando a trabalhar em agências. Na época, concordei plenamente. Hoje, nem tanto. Para poder falar com propriedade sobre um assunto e atingir um número grande de pessoas, você precisa sim estudar e estudar e estudar. Sem parar.
Agora, quanto a ter a cultura vasta, isso é verdade. Não tem como fugir. Tem que estar por dentro da política, da economia, da novela, da música, do cinema, da arte. Porque é daí que saem as ideias. É daí que saem as tendências do que veremos nos próximos meses e até anos. Para quem trabalha com gente, como a gente, é um estudo imprescindível.
Tantos anos se passaram desde que deixei de trabalhar em agências de publicidade e me tornei fotógrafo de publicidade. Igual, mas diferente. Igual no sentido de que cada assunto a ser fotografado é um assunto novo e que a gente precisa correr atrás para poder falar daquilo com conhecimento de causa. E diferente porque agora o fator humano fica mais evidente, já que lidamos muito mais diretamente com o outro. As pessoas precisam interagir com nossas fotos. E então nossa sensibilidade precisa estar cada vez mais aguçada.
Muitos fotógrafos são especialistas em um determinado segmento da fotografia. Na grande maioria das vezes, uns se especializam em fotos de família, outros em fotografia de eventos, casamentos, retratos, moda, gastronomia e por aí vai. Cada dia aparece uma nova necessidade e daí surge um novo mercado. Tudo é “fotografável”, se é que vocês me permitem essa palavra. O dia a dia da fotografia de publicidade não tem rotina. Porque um dia você é chamado para fotografar um produto. No outro, é foto de uma modelo vestindo uma roupa, que é o produto final. Então, vira foto de moda. Depois você tem que fotografar um personagem real para uma campanha testemunhal, em que um personagem ou, por exemplo, funcionário de uma empresa dá seu depoimento sobre um determinado assunto. E isso vira uma foto que se assemelha a um retrato, mantendo as características reais daquela pessoa.
Vai ter também o dia da foto de gastronomia, para a campanha de uma marca de produtos alimentícios. Uma campanha de Natal pode perfeitamente ter a foto de modelos interpretando uma família. E por que isso não seria uma imagem dentro da categoria da foto de família? Pode ser sim. Por que uma foto de bebê para o anúncio de produto para recém nascidos não poderia usar a técnica ou a estética de um ensaio newborn? Pode também. Tudo vai depender do objetivo e da direção de arte da campanha.
E vai chegar o dia em que você terá que fazer várias fotos soltas para depois juntar tudo numa imagem só. Tipo fotografar modelos em estúdio e depois inseri-los numa foto de paisagem que você fez em outro dia. Parece esquisito, parece complexo. E é. Mas é mais comum do que se imagem. Vários são os motivos que levam a uma escolha como essa. Melhor controle da luz no estúdio para os modelos e custos mais baixos do que montar uma grande produção em externa (transporte de equipe, gerador, seguranças, trâmites burocráticos e gastos para fechar uma rua, se for o caso, etc) são apenas dois dos motivos mais comuns. Mas existem vários outros, inclusive do ponto de vista técnico da fotografia.
É aqui que eu volto num assunto que mencionei lá em cima: estudar sem parar. Porque, para você ter essa variedade de repertório e poder fazer um tipo diferente de foto por dia, haja jogo de cintura. Haja dedicação. Nesse ponto, quero juntar duas coisas que não podem ser separadas jamais: o estudo técnico da fotografia e o estudo artístico da fotografia. Não adianta ter técnica e equipamento de ponta se, na hora que você tiver que discutir enquadramento, cores e o clima da iluminação (sensação que a luz vai passar para quem vir a foto), você não tiver base artística e referências sobre o assunto. E também não adianta estar super ligado na arte se, na hora de unir uma foto de paisagem com a de uma pessoa, você não se preocupar em fazer os dois cliques com a mesma perspectiva, a mesma abertura de lente (lembrem-se que grande angulares e teles apresentam características diferentes no resultado de uma foto), mesma altura do tripé com a câmera ou a mesma direção da luz. Imagina o sol na paisagem projetando sombra para a direita e a modelo que você fotografou no estúdio projetando sombra para a esquerda? Incoerente, não? No mundo real, isso não acontece. E também não pode acontecer na fotografia.
No fim das contas, o que quero dizer é que toda foto pode ser publicitária, dependendo especificamente de cada contexto. O que não significa que seja só sair apertando o botão da câmera por aí para ser fotógrafo de publicidade. Pelo contrário. Cada vez mais a gente precisa de técnica, arte e muito, muito planejamento.
E lembrem-se: antes de atender aos nossos objetivos pessoais e profissionais, a fotografia de publicidade deve atender aos interesses comerciais do nosso cliente. É claro que devemos e podemos, artisticamente, dar nossa cara ao trabalho. Mas estamos num trabalho em conjunto e todas as partes precisam sair satisfeitas.